Moto a 2T ou a 4T, qual a melhor para Off-Road?

By on 3 Fevereiro, 2023
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As motas de todo-terreno ou motocross têm passado, desde o seu aparecimento, por épocas ou fases em que um dos ciclos (a 2T ou a 4T) é mais popular que o outro, tanto junto dos fabricantes, das equipas de competição como do público em geral.

Mas afinal quais são as diferenças entre uma moto a 2 tempos e uma moto a 4 tempos?
Não vamos entrar em grande detalhe técnico sobre o funcionamento dos dois ciclos diferentes, vamos antes focar-nos nos resultados em que essas diferenças se traduzem para o piloto e dono da mota e, para isso, vamos apenas introduzir alguns conceitos essenciais.

Tempos … 2 versus 4
Um “tempo” do motor é o percurso do pistão do ponto morto superior ao ponto morto inferior ou vice-versa e cada vez que o pistão realiza esse percurso de ida e volta dá-se uma volta completa da cambota.
De forma muito simples um motor a 4 tempos realiza duas voltas completas da cambota por cada explosão (admissão, compressão, explosão e escape) e um motor a 2 tempos realiza uma volta completa da cambota por cada explosão (neste os “tempos” não estão bem delimitadas e sobrepõem-se, havendo admissão e escape em simultâneo por exemplo) . Isto quer dizer que a moto a 2 tempos produz o dobro das explosões da moto a 4 tempos e por isso, para um motor com a mesma cilindrada, teoricamente o dobro da potência.

Motor 2 tempos


Outro aspeto importante e que vai influenciar, em muito, o comportamento e a sensação de condução da moto é que o motor a 4 tempos tem muito mais peças móveis (válvulas, molas das válvulas, árvores de cames, corrente de distribuição, entre outras) para além das que o motor a 2 tempos também tem, essencialmente cambota, biela e pistão.

Motor 4 tempos


Comecemos por um dos argumentos que mais pesa no momento de comprar uma moto: o preço!
Com uma consulta rápida às tabelas de preços das marcas europeias rapidamente se percebe que uma 450cc 4T é em média cerca de €1000,00 mais cara que uma 250cc 2T. É uma diferença substancial! Para quem está a comprar a sua primeira moto é o suficiente para comprar o equipamento completo: capacete, botas, calças, camisola, óculos, luvas, etc.

O próximo valor que deve ser ponderado é o custo de “abrir o motor” e substituir o pistão (e tudo o que vem por acréscimo) de acordo com as recomendações da marca. Quando chega a altura de fazer essa intervenção num motor 2T, partindo do princípio que é uma operação de manutenção preventiva e não uma reparação, será necessário substituir o “kit do pistão” (que inclui pistão, segmentos, cavilhão e rolamento do cavilhão) e as juntas do cilindro e da culassa. Já num motor 4T teremos que substituir todos esses elementos e eventualmente válvulas, molas das válvulas, correntes de distribuição, etc. Obviamente não é fácil adiantar valores exactos para uma intervenção destas pois variam de marca para marca e “cada caso é um caso” mas podemos dizer que, em média, num motor 2T ficará entre os €250,00 e os €300,00 e para um motor 4T podemos, pelo menos, multiplicar esses valores por dois (e já estamos a ter em conta as horas de mão de obra que no 4T são também mais que no 2T).

Pistão 4T vs pistão 2T

E em relação à manutenção
No caso da típica “mudança de óleo e limpeza de filtro de ar” a complexidade ou simplicidade acaba por ser idêntica em ambos os casos, 2T e 4T, e todas as marcas trazem as instruções necessárias no manual de utilizador da mota. Mas no caso da intervenção falada no parágrafo anterior o caso já muda de figura: abrir o cilindro a uma 4T é muito mais complexo que a uma 2T e não é para todos. Neste caso convém mesmo ter em conta o ditado “o barato sai caro” pois uma troca de pistão feita em casa para poupar uns euros pode ter consequências bem onerosas se não for bem sucedida. Já numa 2T é claro que também pode correr mal, mas se isso acontecer o “estrago” não é tão grande!

Agora que já falámos dos aspetos técnicos e estáticos vamos passar à parte mais interessante: as diferenças dinâmicas, a condução! Quais são as diferenças que vamos sentir passando de uma 2T para uma 4T (e vice versa) com potências equivalentes? E atenção que a palavra usada foi “potências” e não “cilindradas”. Vamos considerar para termos de comparação uma 250cc 2T e uma 450cc 4T que apresentam ambas potências na casa dos 50cv.

Yamaha YZ 250 de 2023

A primeira diferença que vamos notar é a diferença dos sons produzidos: mais agudo na 2T, mais grave na 4T
Mas vamos andar um pouco com elas e já voltamos ao som. Ao arrancar vamos perceber que a 4T é mais fácil de levar, com mais tração e mais disponibilidade. Isto deve-se simplesmente ao fato de ter uma explosão para cada duas rotações da cambota. O que isto quer dizer que é mete potência no chão em intervalos mais longos que uma 2T dando assim mais tempo ao pneu para tracionar. Por outro lado como o motor 4T tem mais cilindrada tem também mais binário. Na prática uma 2T derrapa mais nas curvas e exige mais pilotagem, mais trabalho com a caixa e um controlo mais preciso do acelerador. A 4T é mais permissiva, queixando-se menos se tivermos um trabalho menos preciso com a caixa.

A 2T é mais “nervosa” ou mais reativa que a 4T.

Por exemplo, em linha reta a 4T vai ser mais estável, e mais confortável. Isto deve-se à maior inércia criada pelo motor (mais peças em movimento, mais inércia do motor) uma vez que a inércia é a resistência de um corpo a alterações na sua velocidade. Na prática o que notamos é que uma 4T é menos afetada pelas irregularidades do terreno que uma 2T. Isto faz com que a 4T seja mais confortável e por isso menos cansativa, e quanto mais longa a tirada mais isto se vai fazer notar. Para quem gosta de fazer passeios mais longos ou de “andar para a frente” é um fator a ter em conta. Por outro lado, a característica que a 2T tem de ser mais reativa, de mudar com mais facilidade de direção, faz com que a sintamos mais leve em andamento, mais ágil. Esta é uma das razões para as 2T serem atualmente tão populares nas provas de hard-enduro e extreme-enduro.
Esta diferença de personalidade entre 2T e 4T também se traduz numa maior sensibilidade aos ajustes das suspensões numa 2T, e numa menor necessidade de alterar as afinações das suspensões numa 4T, mais um fator a contribuir para a tal permissividade que mencionámos mais atrás.

Honda CRF 450 2023


E em relação ao que se mete para dentro do depósito?

Pois é, na 4T mete-se sempre menos! A mota 4T gasta menos gasolina e além disso não precisa de óleo para a mistura como a mota a 2T. É claro que já várias marcas fazem 2T com “autolube” (sejam de injeção ou carburador) mas continuam a precisar de óleo para a mistura e continua a ser uma preocupação extra. Se for uma 2T sem “autolube” é importante considerar a distância planeada e levar óleo suficiente para a mistura, o que se pode traduzir em não ser necessário levar óleo nenhum se arrancarmos com o depósito cheio para uma volta na casa dos 80Km ou ser preciso levar quase meio litro de óleo para um dia de 350Km. Isto implica planeamento, ter os recipientes certos, ter onde os levar e, acima de tudo, fazer bem as contas à quantidade de óleo a acrescentar para não haver nenhum azar. Algumas pessoas dizem que “o óleo 2T é um gosto adquirido”, e na verdade o processo torna-se quase automático mas esquecimentos e distrações acontecem, especialmente quando se atesta o depósito pela quarta ou quinta vez e já levamos umas boas horas de todo-terreno.

Agora que já andamos um bocado, voltemos ao som. Já percebemos que o motor 2T produz um som mais agudo, com uma frequência mais alta, e um motor a 4T produz um som mais grave com uma frequência mais grave. Neste ponto é importante mencionar que quanto mais baixa for a frequência do som, mais ele viaja, mais longe se consegue ouvir. Isto quer dizer que a moto 4T vai ouvir-se a uma distância maior que a moto a 2T, especialmente se as rotações forem mais elevadas. Mas tirando esse pormenor técnico gostos não se discutem: há quem prefira o zumbido do 2T e quem não dispense a trovoada do 4T.

Honda CRF 450 Anniversary


Em jeito de conclusão, uma não é melhor que a outra, são diferentes e vão adequar-se melhor ou pior à utilização que lhes dermos. Como em quase tudo nas motas, a escolha poderá ser uma questão de paixão e não de razão!